O álcool é principalmente metabolizado no fígado por três sistemas. Entre eles, as enzimas álcool desidrogenase (ADH) e aldeído desidrogenase (ALDH) formam o sistema mais eficiente de metabolização de etanol em condições subtóxicas, ou seja, consumo leve a moderado. Este sistema converte o álcool etílico (etanol) em acetato em dois passos executados por estas enzimas hepáticas. São eles:
A produção desses NADHs é uma das principais responsáveis pelo efeito tóxico do etanol, entre eles a hipoglicemia que leva ao coma alcoólico e à esteatose hepática (fígado gordo) que leva à cirrose mas isso será tratado em outra ocasião.
O que quero tratar aqui e da variação genética dessas duas enzimas apresentada em populações humanas. Existem vários subtipos dessas enzimas, o que chamamos de polimorfismo. Genes diferentes produzem enzimas ligeiramente diferentes mas que podem funcionar de maneira sensivelmente distintas. Por exemplo, sete subtipos de ADH são produzidos por humanos, entre elas duas são as principais, ADH1B1 e ADH1B2, assim como a ALDH também é produzida em duas formas, ALDH2.1 e ALDH2.2. Para simplificar, vamos chamar de ADH1 e ADH2 e de ALDH1 e ALDH2, respectivamente. A ADH1 é cerca de 5 vezes mais eficiente que a ADH2, enquanto que a ALDH1 é quase 1000 vezes mais eficiente que a ALDH2. Essas diferenças são mostradas no parâmetro de eficiência enzimática (Vmax/Km) na tabela abaixo:
Diversos artigos mostram que pessoas que produzem os tipos 2 dessas enzimas (ADH2 e ALDH2) tem uma espécie de proteção contra o desenvolvimento de alcoolismo desde que a chances destas pessoas se tornarem alcoólatras é significantemente menor. Isto pode ser verificado na tabela abaixo que mostra a razão de chances (odds ratio) do desenvolvimento de alcoolismo em pessoas que possuem as diferentes combinações dos genes de ADH1 e 2, e ALDH1 e 2.
Reparem que o grupo de referência é aquele que possui os dois alelos (genes) ADH1 e ALDH1. Este grupo possui o odds ratio de 1 comparado com os outros. O grupo com a menor chance de alcoolismo é aquele que possui os dois alelos ADH2 e ALDH2 (odds ratio = 0,01). Conforme os alelos dos dois genes do tipo 2 aparecem, aumentam as chances de alcoolismo, sendo que 3 do tipo 1 e um do tipo 2 (ADH1B1/1 e ALDH2.1/2) é o mais alto (0,40).
Resumindo, quanto mais eficiente o sistema de metabolização de etanol, maior a chance de alcoolismo. O autor sugere que o acúmulo de acetaldeído, que é tóxico, pode ser a chave deste efeito já que as combinações onde a ADH é muito eficiente (produz muito acetaldeído) e a ALDH e pouco eficiente (consome pouco acetaldeído) não foram encontradas na população de alcoólatras.
De qualquer forma, parece que quanto mais mal o álcool fizer pro sujeito, menos a chance dele virar alcoólatra. Logo, se você acorda bem depois daquela noitada regada a muita cerveja, uisque, vodca, tequila e cachaça, preocupe-se, você pode ser do grupo 1/1. Ou seja, geneticamente determinado a ser um pinguço.
Referências:
Santos, et al. Alcohol 14, 1997, 3:205-207;
Chen, et al. Chemico-Biological Interactions, 2009, 178:2–7.
Sabia que a minha resistência à ressaca não era coisa boa... rsrs
ResponderExcluirEste post está excelente para ser explorado em aulas sobre cinética enzimática.
Parabéns!